COMO FUNCIONA A RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO

(*) Por Gustavo Hoffman.

A ideia de prática na relação de emprego de ilícitos vedados pelas nossas leis nos remete em um primeiro momento apenas aos atos cometidos pelos empregados e a possibilidade de sanções aos mesmos, sendo a maior delas a conhecida demissão por justa causa (cujo rol de possibilidades se encontra no artigo 482 da CLT).

No entanto, se nos remetermos ao artigo subsequente da Consolidação das Leis do Trabalho, nós adentramos às causas em que se opera uma espécie de “justa causa às avessas” ou seja, nas possibilidades em que pode o empregado requerer a rescisão do contrato de trabalho como se tivesse sido demitido – com direito a todas as verbas rescisórias inerentes do seu contrato de trabalho.

Desta maneira, o artigo 483 da CLT prevê em suas alíneas e parágrafos os casos em que se opera a rescisão indireta do contrato de trabalho, ou seja, se:

a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;

A primeira alínea do art. 483 da CLT prevê diversas hipóteses de rescisão indireta do contrato de trabalho, com previsão de rescisão indireta nas hipóteses em que as leis e/ou bons costumes forem objeto de alguma exigência por parte do empregador, ou quando estes forem superiores às forças do trabalhador (e aqui pensamos na hipótese de um empregado não ter a possibilidade física de executar uma ordem do empregador), ou ainda se os serviços não estiverem estipulados em contrato (não se confundindo aqui as ordens intermediárias para que o trabalho seja executado, quando, por exemplo, o empregado tiver que dirigir o carro da empresa em que labora para se deslocar até o cliente do empregador e realizar um determinado serviço estipulado no contrato de trabalho, sendo a condução do veículo uma mera ordem inerente ao serviço, ainda que não prevista em contrato).

b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo.

O chamado “rigor excessivo” se dá quando o empregador ou algum de seus prepostos pune de forma injusta ou desproporcional o empregado, dando-lhe sanção maior do que a devida (quando, hipoteticamente, o empregado é demitido por justa causa quando falta pela primeira vez injustificadamente no trabalho). Hipóteses em que o empregador age com má-educação, maus tratos, falta de cortesia reiteradas vezes junto ao empregado também são encaradas por nossos tribunais como sendo rigor excessivo.

c) correr perigo manifesto de mal considerável.

O empregador não pode colocar o empregado a uma exposição desnecessária de risco, quando, por exemplo, determina a ele executar um serviço de manutenção elétrica sem que o funcionário tenha a aptidão para tanto.

O perigo excessivo somente pode ser exercido pelos empregados que tenham a aptidão técnica para exercer atividades perigosas, como, por exemplo, um técnico em eletricidade. Logo, se a atividade for perigosa, mas for exercida por alguém apto e contratado para executa-la, não caberá a rescisão indireta do contrato de trabalho.

d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato.

Os casos mais comuns em que isso ocorre são os atrasos significativos de pagamento de salários, FGTS etc. No entanto, a mera impontualidade não corriqueira (aqueles dias de atraso no pagamento) geralmente não são enquadrados pela nossa Justiça do Trabalho como passíveis de rescisão indireta. Nessa hipótese é facultado ao empregado permanecer no emprego, mesmo que tenha requerido a rescisão indireta judicialmente.

e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama.

O empregador, ou algum de seus colaboradores não pode praticar atos contra um empregado que o desonrem, ou denigram a família deste, como, hipoteticamente, espalhar qualquer tipo de fofoca pelos quatro cantos da empresa sobre um determinado empregado ou um membro de sua família.

f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem.

Salvo na legítima defesa própria ou de terceiro, o empregador ou seus colaboradores não podem atentar contra a integridade física de qualquer empregado, sob pena de rescisão indireta do contrato de trabalho.

g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.

Essa hipótese é muito comum quando um empregado que atue com vendas vê o seu empregador lhe tirar seus clientes para que o colaborador peça demissão, ao invés de lhe pagar as verbas rescisórias do mesmo. Nessa hipótese, a exemplo daquela prevista na alínea “d)” é facultado ao empregado permanecer no emprego, mesmo que tenha requerido a rescisão indireta judicialmente.

O § 2º do artigo 483 da CLT prevê que no caso de morte do empregador constituído em empresa individual, é facultado ao empregado rescindir o contrato de trabalho.

Também cumpre esclarecer que a CLT, em seu artigo 407, Parágrafo Único, prevê uma hipótese de rescisão indireta do contrato de trabalho do menor de idade, a qual ocorre se o empregador ignorar uma autuação que obrigue este a  mudar o menor de função, quando o trabalho foi considerado como prejudicial à saúde do menor, ou ao seu desenvolvimento físico ou mesmo a sua moralidade pela autoridade competente.

Por fim, é importante deixar claro que, para se operar a rescisão indireta do contrato de trabalho cabe ao empregado exercer esse direito de forma imediata à conduta do empregador, sob pena de se entender que o trabalhador concedeu o perdão tácito ao patrão (ainda que nas hipóteses aqui ressalvadas possa o empregado seguir trabalhando mesmo após ingressar com o processo judicial, como nas alíneas “d)” e “g)” do art. 483 da CLT).

(*) Gustavo Hoffman é especialista em Direito do Trabalho da Leone, Fernandes, Hoffman e Cardoso Advogados